“Sakineh está salva”, diz líder iraniana.
Reportagem retirada do site http://www.abi.org.br/sakineh-esta-salva-diz-lider-iraniana/
Uma das mulheres mais surpreendentes da atualidade, a iraniana Mina Ahadi, nascida na cidade de Abhar, em 1956, esteve no Brasil, convidada pelo Instituto Millenium, para participar do 2º Fórum Democracia & Liberdade, realizado em São Paulo. Viajou também ao Rio de Janeiro, onde fez uma palestra no Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec), e ainda a Brasília, quando manteve encontros com órgãos do Governo ligados aos direitos humanos.
Mina apareceu no cenário mundial ao ter uma atuação de impressionante coragem na defesa da sua compatriota Sakineh Mohammadi Ashtiani, condenada à morte por apedrejamento e que, diante da manifestação de repúdio da opinião pública e da mídia do mundo inteiro, teve a pena suspensa. Ela nos deu essa entrevista exclusiva no Rio, na sede do Ibmec, e, como só fala os idiomas persa e alemão, a entrevista não teria sido possível de ser realizada sem a tradução do alemão para o português feito pela jornalista Christiane Romeo, que a acompanhava.
Mina é fundadora do Comitê Internacional contra o Apedrejamento e ainda do Conselho Central dos Ex-Muçulmanos. Além dos sites www.notonemoreexecution.org e www.stopstonningnow.com/wpress/. Integra também o Comitê Central e Politburo do Partido Comunista Iraniano. Em 2008, foi agraciada com um prêmio da mídia de Viena, por conta do seu livro Ich habe abgeschworen (Eu Abjurei), publicado em 2007, em co-autoria com Sina Vogt. Durante a Revolução iraniana, ela estava em Tabriz e participou ativamente do movimento. Seu marido, também um ativista político, foi executado no dia do aniversário de casamento.
A execução tornou-se uma motivação ainda maior para sua luta contra o apedrejamento no Irã. Mãe de duas filhas, Mina Ahadi mora há 14 anos na Alemanha e recentemente ajudou a libertar a iraniana Nazanin Fateh, também condenada ao apedrejamento. Devido às ameaças de morte, ela vive sob proteção da Polícia alemã, pois ao criar o Conselho Central dos Ex-Muçulmanos, entidade de apoio a pessoas que abdicaram da fé islâmica, passou a receber ameaças de morte que a obrigam a viver quase reclusa. Renunciar ao Islã é considerado entre muçulmanos uma ofensa grave, punível com a pena de morte.
No entanto, hoje, em razão, de seu trabalho e de organizações internacionais de defesa dos direitos humanos, nenhum dos países onde vigora a “sharia” (conjunto de leis islâmicas), como a Arábia Saudita, aplicou esta sentença nos últimos anos. Porém, dois grupos radicais muçulmanos, os “talibãs”, no Afeganistão, e os “shebab”, na Somália, ainda recorrem a ela.
Até mesmo no Irã, onde, segundo a imprensa, seis pessoas foram apedrejadas nos últimos cinco anos, este tipo de condenação por adultério ou fornicação é cada vez menos frequente, analisa Malcolm Smart, diretor do Departamento do Oriente Médio e do Magreb da Anistia Internacional: “Atualmente, não se aplica muito no Oriente Médio, nem no mundo muçulmano, nem mesmo no Irã”, revela. Nesta entrevista Mina Ahadi traça um quadro das agressões aos direitos humanos e às mulheres no Islã. Seu depoimento:
“Vou tentar descrever o panorama atual e, por que não dizer de sempre, do mundo islâmico, do que é ser humano, ser mulher. Do que é ser ideologicamente contrário aos sistemas crônicos e milenares de tratamento à pessoa e dos disparates praticados por líderes que se perpetuam no poder. E chegam à barbárie de interferir para que as Constituições desses países tenham artigos que penalizem os cidadãos e, principalmente, a mulher com as penas mais abjetas e humilhantes possíveis. E o que me deixa mais constrangida e indignada é que isso se passa em pleno século XXI e diante do olhar complacente dos países do Ocidente.
Quero dizer que, apesar de ser iraniana e, portanto, originária de uma cultura completamente diferente, não estou indiferente aos problemas femininos mundiais, mesmo morando na Alemanha e distante do mundo árabe. Mas na Alemanha sei exatamente todas as situações aflitivas por que passam as mulheres no Brasil e em tantos lugares. Entristeço-me muito, pois somente com a ajuda masculina podemos subverter esse, digamos, padrão estabelecido; ela vem, em tantos países, de forma lenta e preconceituosa.
Até o ginásio, vesti meu véu, cobri meu rosto, mostrando apenas meus olhos. Mas (quer saber?) já queria usar minissaia, sapato alto, óculos escuros. Não para me ocidentalizar, nada disso, para me rebelar, para transgredir, para dizer que tudo aquilo era uma grande besteira e um imenso retrocesso social. No primeiro dia na Universidade de Tabriz, onde estudava medicina, joguei o véu fora, coloquei um vestido e fui assim estudar (risos). As meninas me olharam espantadas; no entanto, no dia seguinte, algumas apareceram também de vestido. Por dentro eu ria satisfeita, havia conseguido uma vitória.
Na universidade logo conheci uns rapazes e moças de esquerda. Protestávamos timidamente contra tudo e todos, pois naquele tempo (final do Governo do aiatolá Khomeini) não podíamos nem ler um livro que não fosse de nosso curso ou religioso e já éramos considerados subversivos. Fazíamos passeata, dispersada na força, a pancada mesmo, e eu lá. Eu queria ficar na frente, ser a primeira e, por isso mesmo, também a primeira a apanhar (mais risos). Fazia questão de me expor, para eles saberem que eu existia e me opunha ao regime opressivo.
Um dia apareceram lá uns jornalistas da BBC de Londres e fizeram uma reportagem sobre o nosso movimento. Eu tinha 24 anos, hoje tenho 54, portanto, há 30 anos esse Governo está no poder. Quero deixar bem claro que não me refiro à política externa do Irã e à interferência em nossos assuntos internos por parte dos Estados Unidos. Se uns podem ter bomba atômica, por que outros países não podem? Estou apenas comentando essa situação. Por favor, não estou afirmando que temos. Segundo o Presidente Ahmadinejad (Mahmoud), nossa utilização de energia nuclear é pacífica e devemos acreditar nisso, mas quem tem que decidir sobre isso somos nós. Todos os paises têm o direito inalienável, sagrado, de decidir sobre seu destino, de comandar seu veículo e não deixar que outros o dirijam por ele.
Dizia então que não me refiro à política externa do Irã. Minha luta é contra o não cumprimento dos direitos humanos em meu país e no mundo árabe. Não faço política, tento mostrar ao mundo islâmico que existe algo chamado direitos humanos que precisa ser conhecido por lá e cumprido. A mulher não pode mais ser tratada abaixo de um animal, não pode mais ser alguém pela metade. Ser submetida a toda sorte de penas, como o aviltante apedrejamento e a submissão às ordens do homem. Lá, uma mulher não pode, por exemplo, pedir o divórcio.
Uma amiga minha, médica cirurgiã, procurou o juiz para requerer o divórcio. Ele perguntou a ela por que razão queria se divorciar. Ela respondeu que o marido a submeta a toda sorte de maus tratos. O juiz então exigiu que relatasse os maus tratos. Minha amiga falou que apanhava sempre, que era ofendida diariamente por palavras e atitudes, forçada a fazer sexo quando ela não queria e muito mais. Calmamente o juiz a mandou ir para casa, que isso não era nada e mulheres não podiam contestar seus maridos e, sendo assim, não poderiam requerer o divórcio.
Lembro-me de quando eu era criança e era obrigada (obrigada para mim, porque na sociedade é uma coisa normal) a servir meus irmãos na mesa, quando comíamos. Um dizia: “Mina, vai pegar minha água”: outro “Mina, traga meu doce ou meu chá”. E era assim o dia todo. Eles nem faziam por mal, era assim com seu pai, foi assim com seu avô e agiram dessa maneira nossos antepassados. A mulher, em muitas famílias, é vista abaixo de um cachorro. No entanto, hoje vejo que em escala menor é um problema global. No Brasil, metade da população é de mulheres, mas apenas 20% ocupam cargos no Congresso.
É uma coisa doida, maluca. Uma ordem sexual em que a mulher não pode nem dizer um “não quero”, sem liberdade de escolha nem de opinião. Uma sociedade feita para os homens. Uma mulher, por exemplo, não pode fundar um partido. Vocês no Brasil não têm idéia do que seja isso. Quando um dia resolvi não usar o véu e mostrar meu rosto, um fato normal em qualquer sociedade civilizada, começou o grande drama da minha vida. Mas essa reportagem da BBC, como eu disse, espalhou nosso movimento pelo mundo todo. Foi ótimo. E o mundo acordou para o problema.
Essa minha via-crucis (para usar uma imagem cristã) começou cedo. Em 1980, meu marido, estudante de Física, foi preso, torturado e morto. A Polícia ficou uma semana em minha casa e eu escondida em outro lugar, fugindo daqui pra ali. Ao todo sete pessoas ligadas a mim, entre amigos e familiares, foram executadas, sem julgamento. Cada dia eu ficava em uma casa diferente, mudando sempre. Mas as pessoas que me abrigavam tinham medo, muito medo, se fossem pegas era morte na certa.
Um dia aconteceu um fato inacreditável. Estava escondida na casa de um amigo, e ele me disse: ‘Se chegar a Polícia você pula pela janela e, só pra te avisar, eu moro no 3º andar’. Concordei, não tinha outra saída. Nessa mesma noite chegou a Polícia. Acordei sobressaltada com uma enorme confusão no prédio. Ele bateu levemente na porta do meu quarto e sussurrou: “Mina, eles estão aí se joga, se joga logo”. Eu fui até a janela, olhei pra baixo e pensei: “Não vou me jogar coisa nenhuma, não posso me jogar. Não vou morrer dessa forma inglória e covarde. Eles que me prendam, que tenham, pelo menos, o trabalho de me prender e me matar”. Mas não era a mim que procuravam, era outra pessoa. Pegaram-na e foram embora. Imagine se eu tivesse me jogado.
Dali, fugi para o Kurdistão, aos trancos e barrancos. Fiquei morando numa cidade do interior. Sabiam quem eu era. Ensinaram-me a trabalhar no rádio. Tive um programa de boa audiência, sempre em defesa dos direitos humanos e da mulher. Permaneci no Kurdistão por quatro anos. Depois fui morar em um vilarejo, praticamente feito de tendas, entre o Irã e o Iraque, na época da guerra entre os dois países e sobrevivi aos ataques aéreos. Servia como médica cirurgiã em um campo de refugiados e feridos e me sentia bem ali, trabalhando como voluntária. Eram umas tendas legais, tinham até cinema. Vivi de experiência em experiência por cerca de dez anos até fugir para Viena, na Áustria, em 1990 e depois para Colônia, na Alemanha, em 1996.
Há dois anos estou em casa, à noite, e recebo uma ligação telefônica de um estudante do Irã muito assustado em que ele dizia: “Por favor, me ajude, minha mãe, Sakineh Mohammadi Ashtiani, vai ser apedrejada”. Respondi: “Vou ajudar”. E perguntei: “O que é isso, apedrejamento?” Ele disse que ela havia sido julgada por adultério, condenada e a pena era essa. Então, me surpreendi, pois não havia esse artigo na Constituição iraniana, embora exista na “sharia”. É que, no período posterior à minha fuga, ela havia sido mudada, covarde e cruelmente, para acrescentar itens que causassem sofrimento e humilhação às mulheres.
Para o mundo ocidental e para as felizes mulheres que moram aqui e não sabem o que é um apedrejamento, vou descrevê-lo. Abre-se um buraco no chão, o suficiente para caber uma pessoa em pé. Busca-se a vítima em tal dia e tal hora, em geral ao amanhecer, e conduzem-na pelas ruas, enrolada em uma túnica mortuária, para que seja alvo da curiosidade alheia e jogam-na no buraco e cobrem-na de terra até o peito; no caso dos homens, até à cintura.
Dependendo da condenação, é o juiz quem atira a primeira pedra. Mas pode ser também uma das testemunhas. Se a vítima é uma mulher sentenciada por adultério, por exemplo, tanto o seu marido quanto a família dele podem lançar as primeiras pedras. A lei diz que elas têm de ser grandes o suficiente para machucar a vítima, mas não para matá-la no primeiro ou segundo golpe. Os homens então começam a atirar tantas pedras quantas sejam necessárias para que ela morra.
E o grande momento desse circo de horror é saber quem atirará a última pedra. Quando isso acontece, aquele que atirou essa pedra maldita é exaltado, festejado e tratado como herói. No Irã, o homem é enterrado até à cintura e a mulher, até o peito. Se o condenado conseguir sair sozinho, se livra da morte. Em outros países, são presos a uma árvore ou lançados ao chão, às vezes com os rostos cobertos, outras vezes, não. Praticamente todos os dias eu recebo chamadas de condenados me pedindo ajuda para esse tipo degradante de condenação. As prisões estão lotadas. Há, inclusive, crianças e adolescentes aguardando fazer 18 anos para serem executados.
Esse crime não é somente praticado pelos que ali estão, é de todo o país, é de toda a humanidade. Se não houver uma pressão mundial eles não vão parar com essa barbárie e me sinto honrada por esta entrevista à Associação Brasileira de Imprensa, pois preciso da ajuda de entidades dessa importância para extinguir uma prática que remete à pré-história da raça humana. Não descansarei enquanto não acabar com essa violência que fere todos os princípios dos direitos humanos nos países em que é praticada e que é bom que se revele: não é somente no Irã, é também no Sudão, Afeganistão, Nigéria, Arábia Saudita, Somália.
Minha vida é dedicada a essa luta. Já falei em todos os lugares do mundo em que me permitem falar e não tenho medo de perder minha vida em prol dessa causa. Lutei contra o apedrejamento de Nazanin Fateh, engenheira petrolífera, mãe de dois filhos, e consegui salvá-la. Mas em 2001, na Nigéria, cheguei tarde para salvar uma outra da morte. Quando viu os homens virem buscá-la desmaiou. Foi levada numa maca ao local do apedrejamento e morta. Morta como se mata um animal selvagem e morta por homens muito mais culpados do que ela. Nunca a frase de Jesus foi tão verdadeira: “Quem não tiver culpa que atire a primeira pedra”. E desde quando adultério é crime de morte em uma sociedade moderna?
É crime de morte nos países em que existe como arma política de intimidação. Para impor o medo, o terror. Como forma de manter a autoridade. Os mesmos processos utilizados pelos governantes da Idade Média no mundo islâmico. Em alguns países, como na Nigéria, conseguimos salvar algumas mulheres do apedrejamento (digo conseguimos porque hoje outras pessoas estão comigo nessa luta). Desde que fundei o Comitê Internacional contra o Apedrejamento e ainda os sites www.notonemoreexecution.org e www.stopstonningnow.com/wpress/ as denúncias de apedrejamento e crimes de toda ordem contra as mulheres chegam diariamente e nós tentamos resolvê-los da melhor forma possível, principalmente com o precioso apoio dos meios de comunicação.
Embora tenha uma ideologia definida de esquerda, busco unicamente o objetivo de salvar vidas humanas inocentes. Dirigentes de direita já me ajudaram e dirigentes de esquerda já se mostraram mesquinhos com minha luta. Quantos governantes de países das mais variadas tendências ideológicas já deram de ombros aos meus apelos, dizendo que o Irã e as outras nações que praticam crimes contra os direitos humanos e as mulheres são países muçulmanos e lá é assim mesmo, é normal. Seria normal se as mães, as mulheres ou as filhas deles fossem apedrejadas?
Eu esperava mais de determinados líderes ocidentais. Estranhei, inclusive, o fato de o Presidente Luíz Inácio Lula da Silva, embora o respeite muito, ter abraçado o Presidente Mahmoud Ahmadinejad, anunciado ser seu amigo e não tê-lo pressionado para acabar com as práticas medievais aplicadas contra as mulheres no Irã. Fez exatamente o que outros líderes fizeram. Pergunto: por que fechar os olhos para o que acontece nesse campo, só porque existem outros interesses em jogo, como o comercial e o econômico?
Mas com relação à Sakineh, a participação do Brasil foi louvável, especialmente dos meios de comunicação. E posso garantir que pesou muito na decisão de reverter sua execução. Sakineh já está salva. Por quê? Graças à repercussão que o caso alcançou, o regime não pode mais executá-la – nem pública nem clandestinamente. O Governo já está convencido disso. Apenas busca achar um meio de não sair desmoralizado do episódio. Todo esse processo, no fim, foi bom para o Irã. Chamou a atenção do mundo para a barbárie do regime. Antes do caso Sakineh, a preocupação dos países em relação ao Irã se limitava à questão nuclear.
Estive em Brasília ontem (dia 5 de maio) e mantive encontros com Maria do Rosário (secretária de Direitos Humanos da Presidência da República), Paulo Paim (senador-RS) e Marco Aurélio Garcia (assessor da Presidência da República para Assuntos Internacionais). Porém, saí de lá desapontada. Esperava atitudes mais enérgicas, mais objetivas e senti apenas respostas evasivas e “vamos ver”. Já conheço esse comportamento dos dirigentes ocidentais. É apenas uma forma cortês de dizer: “Não temos nada com isso”.
Na Europa é a mesma coisa. Os países mantêm relações comerciais com o Irã e outras nações do Oriente Médio; então, não querem se envolver. Isso no campo oficial, porque as organizações não-governamentais nos auxiliam bastante. No entanto, aos poucos, timidamente, vamos nos impondo. Antes, na Europa, éramos estrangeiros, hoje somos muçulmanos. Na Alemanha, somos mais de três milhões. E nos respeitam, especialmente no campo religioso. E não aceitamos que organizações árabes que não conhecemos a fundo, no seu núcleo ideológico, na sua infra-estrutura, falem por nós e decidam o que devemos fazer. No fundo, muitas dessas organizações querem apenas fazer política ou espalhar controvérsias e desentendimentos.
Recentemente, na Suíça, houve um debate sobre os minaretes. E em vários outros países da Europa a discussão sobre o Islã se acentua e todos procuram nos conhecer melhor. Aqui mesmo no Brasil fez sucesso a novela “O Clone”. Nunca o Oriente Médio esteve tão em evidência na mídia e nossa cultura e religiosidade motivo de curiosidade. Porém, é necessário que o Ocidente compreenda que não somos uma massa disforme e alienada; somos uma cultura milenar, riquíssima e inteligente, que muito influenciou o modo de vida ocidental.
Nas minhas andanças pelo mundo tento mostrar que a mulher pode e quer participar. Na maioria das vezes falo para uma platéia de homens, mas adoro estar ao lado deles (a gargalhada e o rosto vermelho como tomate mostraram uma Mina Ahadi bem globalizada), mas certamente eles transmitem o que eu digo para suas mulheres. Eu gasto tanto dinheiro com ligações telefônicas para todo o mundo, nessa luta, que minha filha diz que com essa quantia poderia ter comprado carros e casas (embora esteja sempre ao meu lado nesse trabalho), mas creio que não seria mais recompensador do que divulgar aos quatro cantos as ofensas à dignidade e moral da mulher árabe.
No entanto, enquanto evoluímos em outros campos no dos direitos humanos estacionamos e mesmo em alguns aspectos regredimos. Nestes 30 anos, desde que começou a minha luta, 150 mulheres morreram apedrejadas no mundo árabe e 50 gays. E muitas mulheres e gays pensam: “Se eu não for apedrejada agora poderei ser no futuro”. E vivem com essa neurose opressiva na mente pela vida afora. Mas Deus quer que todos nos amemos. Tem uma música famosa no Irã que diz: “Vamos amar, dançar, ser felizes, ser alegres e curtir a vida, porque o amor é universal e eterno”.
Estou contente por estar no Rio de Janeiro, um lugar onde as mulheres alcançaram, ou melhor, obtiveram uma liberdade invejável. De ir às praias e mostrar seus belos corpos de biquínis sumários (risos), de freqüentar a vida noturna, de sair no Carnaval e, acima de tudo, de impor sua vontade, seu pensamento, de exercer seu direito à liberdade de expressão. Mas para isso tiveram a participação masculina. Essas são relações recentes, num mundo onde existem agora o Facebook, o Orkut, o Twitter, a tv, as redes sociais. No entanto, no Oriente Médio parece que tudo anda há mil anos atrás.
Líderes como Kadafi (Muammar), Mubarack (Hosni), Ahmadinejad, entre outros, precisam ser extirpados da sociedade. Não de uma forma cruel, ou por interferência externa através da força, mas por decisões tomadas em votação pelos países integrantes da Onu. Decisões tomadas de forma civilizada e humana, sem colocar mais violência e miséria em uma região tão devastada pelas tragédias. Atingir o âmago da questão, a sua essência milenar, através de meios saudáveis e amigos e não oportunistas, casuais e interesseiros.
Hoje estamos muito próximos uns dos outros, a tv, a Internet, nos aproximou definitivamente. Não existem mais o homem e a mulher brasileiros, iranianos, americanos, franceses, chineses, existe o ser humano global, universal. Portanto, o resultado disso é que todos os dramas agora são nossos dramas, todas as tragédias são nossas tragédias e todas as vitórias e conquistas nossas também. Hoje os meios de comunicação criaram um só homem e uma só mulher, unidos, todos, pelos olhos atentos dos satélites. E, acima de tudo, com a consciência, depois de tantas calamidades, de que estamos todos no mesmo barco e se não remarmos direito ele afundará”.